Discursos

Discurso de Posse do presidente da ABRHAGI para o biênio 2020-2022, Luciano Dídimo Camurça Vieira (11/02/2020)

Meus caros confrades da Academia Brasileira de Hagiologia, representantes das demais academias cearenses aqui presentes, familiares e amigos. Assumir a presidência da ABRHAGI não é para mim motivo de alegria, nem de honra, nem de vanglória. Assumir a presidência da Abrhagi para mim é um sinal de compromisso e de responsabilidade. Em outubro do ano passado nosso presidente de honra José Luís Lira me enviou uma mensagem dizendo: “Pense na Presidência da Abrhagi. Você é a pessoa certa. Veja como uma missão. Essa Academia é de Deus.” Eu estava terminando meu segundo mandato de três anos como Presidente da Ordem dos Carmelitas Descalços Seculares em nossa Província e tudo o que eu queria era um bom período de descanso. Mas essas palavras ficaram remoendo dentro de mim por alguns dias. De fato, a Abrhagi é uma academia diferenciada. Ela não é uma academia de letras, mas é relacionada às letras. Não é uma academia de artes, mas é ligada às artes. Não é uma academia de retórica, mas é ligada à retórica. E além de tudo, tem um algo a mais. Um algo a mais muito especial. Ela é de Deus. Uma Academia de Deus, voltada para as coisas de Deus, para os santos, para o sagrado. E sendo de Deus, entendi que aquela pequena mensagem do Lira era um chamado. Um novo chamado. Uma nova missão. Uma missão que eu tenho a certeza absoluta de que não tenho nenhuma capacidade para assumí-la. Mas também sei que Deus costuma chamar para suas missões exatamente os menos capazes, para que assim a sua Glória possa se manifestar. Por isso, resolvi dizer sim a esse novo chamado. Para que a vontade de Deus seja realizada através da minha pequenez, da minha fraqueza, do meu nada. Foi então eu me lembrei de um poema que escrevi há alguns anos atrás, que se chama “A vontade de Deus”, e que diz assim:

A vontade de Deus
Não é pra ser entendida
A vontade de Deus
É pra ser discernida

A vontade de Deus
Não é pra ser contestada
A vontade de Deus
É pra ser acatada

A vontade de Deus
Não é pra ser estudada
A vontade de Deus
É pra ser realizada

A vontade de Deus
Na oração é discernida
No coração é acatada
E na ação realizada

Dessa forma, em agradecimento ao Lira, por ter sido instrumento da vontade de Deus na minha vida, e trazendo aqui a memória de Horácio Dídimo, que foi membro desta Academia, gostaria de fazer uma dupla homenagem lendo um poema de Horácio Dídimo a ele dedicado:

ALGUM POEMA?*
Para José Luís Lira

Quando surge de repente
Algo que inspira uma prece
Uma luz brilha na mente
E algum poema aparece.

Um poema da beleza
De um tempo que não se apaga
Sob os céus de Fortaleza,
Sobral ou Guaraciaba.

Um poema biografia
De novas academias
Nas asas da hagiologia.

Um poema de amizade,
Um lirismo de mãos dadas:
Constelação de saudades.

Exercícios de Admiração
Horácio Dídimo

Também gostaria de agradecer ao meu antecessor Vicente Maia, que por dois biênios, trabalhou incansavelmente para revitalizar, reorganizar e reestruturar a nossa Academia, e de fato, graças a Deus, teve muito êxito. Hoje a academia é outra! Muito obrigado, Vicente, porque você chegou na hora certa e na hora certa, deu uma nova vida À Abrhagi. Por isso, a você dedico este poema de minha autoria:

A HORA CERTA

Eu sei que tudo tem a sua hora
Hora que se ri e a que se chora
Uma hora que pode ser agora
Ou hora que às vezes se demora

Pois na demora Deus nos aprimora
E o que já era bom Ele melhora
Com sua intercessão, Nossa Senhora
Nos consegue até juros de mora

Eu sei que tudo tem a sua hora
A que somos feridos com a espora
Ou a que a esperança revigora

Eu sei que tudo tem a sua hora
Pois o amor de Deus sempre se aflora
E na hora incerta comemora!

Luciano Dídimo

Mas essa posse está acontecendo em uma data muito especial, onde estamos celebrando os 15 da Abrhagi. Foi fundada em 08/12/2004, dia da Imaculada Conceição, portanto os 15 anos de fundação foi em dezembro passado. Mas hoje, dia de Nossa Senhora de Lourdes, é o aniversário da instalação e da primeira reunião da Academia ocorrida em 11/02/2005. Aqui estamos então no mesmo lugar onde ocorreu a primeira reunião, no salão da Gruta de Nossa de Lourdes, no Colégio Imaculada Conceição. Por isso, para saudar Nossa Senhora de Lourdes, trago aqui mais um poema de Horácio Dídimo, uma vez que ele tanto recorreu à sua intercessão, especialmente pela pela vida e pela saúde do meu irmão Carlos Horácio, que também aniversaria na data de hoje.

NOSSA SENHORA DE LOURDES

11 de fevereiro de 1858
A menina Bernadette
Vê uma bela Senhora
Bem defronte a uma gruta
Perto de Massabielle.

É Maria Imaculada
Nossa Senhora de Lourdes
Toda vestida de branco,
Resplandecente de luz.

Da rocha jorra uma fonte
De águas miraculosas
Curando as enfermidades

Do coração de Maria
Jorra a verdade e o amor
De Cristo Ressuscitado

Horácio Dídimo

Porém a patronesse da Abrhagi não é nem a Imaculada Conceição e nem Nossa Senhora de Lourdes. A Academia tem como patronesse Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil, exatamente por ser uma academia de caráter nacional. E foi exatamente para dar força a esse caráter nacional, que escolhi dos seis membros que compõem a diretoria comigo, três membros de outros estados, fazendo com que a nossa Academia possa verdadeiramente ter uma atuação em todo o Brasil.Assim, como primeira proposta desta Diretoria que hoje assume, conclamamos a todos os confrades e convidamos o público em geral a abraçarem a ideia de realizarmos o I CONGRESSO BRASILEIRO DE HAGIOLOGIA no feriadão de 10 a 12/10/2020, na festa de nossa patronesse Nossa Senhora Aparecida. E como discurso de poeta e filho de poeta é sempre recheado de poesia, para homenagear nossa padroeira Nossa Senhora Aparecida, trago então mais dois poemas: O primeiro de minha autoria, intitulado

MÃE APARECIDA:

Oh Mãe Aparecida
O Brasil te venera
Olha compadecida
O povo que espera

Oh Mãe Aparecida
O amor prolifera
Beija o suicida
Vê quem se desespera

Dá amor sem medida
Cuida de cada vida
Da nossa biosfera

Dá fé a quem duvida
Saber a quem lidera
Trabalho a quem se esmera

Luciano Dídimo

E o segundo poema, como não podia deixar de ser, de autoria de Horácio Dídimo, intitulado NOSSA SENHORA APARECIDA - Padroeira do Brasil:

Ó Nossa Senhora da
 Conceição Aparecida,
Aparecei nos momentos
Difíceis de nossa vida!

Mostrai-nos como chegar
Ao vosso Filho Jesus,
Aparecei como a aurora
Da plenitude da luz!

Velai sobre as nossas casas,
Curai as nossas famílias,
Protegei nosso País!

Abençoai as crianças,
Mãe das nossas esperanças,
Padroeira do Brasil!

Horácio Dídimo

E por fim,agradecendo a presença de todos os que se fizeram presentes a essa sessão, gostaria de encerrar essa fala com um soneto de minha autoria em homenagem à nossa querida ABRHAGI e escrito especialmente para esta ocasião:

ACADEMIA BRASILEIRA DE HAGIOLOGIA

No Brasil foi fundada a Academia
Dedicada a estudar os nossos santos
Aquilo que é sagrado e seus encantos
Que tem foco total na Hagiologia

Estuda os movimentos messiânicos
Candidatos às honras dos altares
Estudos realmente salutares
Porém fundamentados e canônicos

É uma academia abençoada
Que em oito de dezembro foi fundada
Dia da Conceição Imaculada

Tem como patronesse a Mãe querida
Que por nós será sempre enaltecida
Nossa Virgem Senhora Aparecida

Luciano Dídimo

Muito obrigado!

Fortaleza, 11 de fevereiro de 2020

Luciano Dídimo 

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Mensagem do confrade Fábio Tucci Farah por ocasião da posse da diretoria da ABRHAGI biênio 2020-2022 (11/02/2020)

Caros confrades e confreiras,

Sinto-me afortunado por ter sido acolhido na Academia, há três anos. Em minha posse, manifestei a razão primordial: “Somos abençoados com a presença real de nossos patronos e patronesses que, de modo único, nos assistem na caminhada rumo ao Reino definitivo”. Hoje, começo um novo capítulo na ABRHAGI, desta vez como Secretário Geral. Agradeço ao presidente Luciano Dídimo pelo convite, ao presidente da gestão anterior, Vicente Maia, pela generosidade com a qual recebeu tantas petições e projetos, e a todos os confrades e confreiras, pela amizade e confiança. Embora não pude estar presente nesta solenidade, gostaria de compartilhar uma lembrança com todos; uma lembrança que me arrasta para a infância e ao mesmo tempo faz desaparecer a distância que nos separa.

Quando tinha sete anos, recebi um pequeno tesouro de minha avó materna, Maria de Lourdes. O baú era uma caixinha de latão da Fábrica de Doces Santa Therezinha, com a imagem da santa francesa festejada no mesmo dia em que comemorava meu aniversário – claro, não sabia disso naquela época. Ao descerrar a reluzente tampa, não encontrei os prometidos “doces fabricados com as próprias frutas e embalados exclusivamente a mão”. Provavelmente, minha avó havia se deliciado com essas iguarias décadas atrás. E preenchido o espaço com algo pouco palatável para um garoto de sete anos. O que um garoto de sete anos desejava ganhar, naquela época, além de carrinhos, ossos de dinossauro, tesouros de pirata, espadas de cavaleiros medievais?

O delicioso recheio de outrora havia dado lugar a dezenas de imagens de homens e mulheres – e eles não se pareciam com os super-heróis aos quais estava habituado. Ao fechar os olhos por alguns segundos, ainda enxergo as que mais me impressionaram: uma bela jovem com os olhos em um prato, um rapaz com o corpo coberto por flechas, um gigante com um garoto no ombro, uma adolescente queimando na fogueira, um homem com uma espada parecida a de um cavaleiro medieval. As “figurinhas” repetidas eram de alguém mais familiar, alguém que sempre me recebia de braços abertos na igreja que costumava frequentar. Talvez a parte mais fascinante daqueles pequenos cartões estivesse no verso. Havia uma maneira simples de convidar essas personagens para fazerem parte do meu dia a dia. E a promessa de que me ajudariam com diversos percalços, a maioria desconhecida para aquele garoto que ainda engatinhava pela vida.

Em pouco tempo, minha infância foi povoada por amigos nem tão imaginários assim. Trinta e cinco anos se passaram desde que recebi aquele pequeno tesouro. Com o passar das décadas, a antiga imagem reluzente de Santa Teresinha se tornou um borrão de ferrugem. E as imagens nos cartões de papel ficaram salpicadas com as marcas do tempo. Quando resgatei o presente de minha avó pela última vez – não faz tanto tempo –, me dei conta de que o verdadeiro tesouro não era a bela coleção de santos. Tampouco as guloseimas que jamais experimentei. O tesouro eram as amizades que passei a cultivar desde pequeno. E que jamais me abandonaram. Hoje, de olhos abertos, consigo enxergar aquelas personagens, outrora misteriosas, que fascinaram o garoto de sete anos. Todos estão comigo enquanto ouvem essa mensagem. E também, caros confrades e confreiras, estão entre vocês.

Que nossos amigos no Reino dos Céus continuem iluminando nossa peregrinação pela vida e abençoando nossa estimada Academia.


São Paulo, 11 de fevereiro de 2020.

Fábio Tucci Farah

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Discurso de Saudação aos novos Acadêmicos da ABRHAGI proferido por Neuzemar Gomes de Moraes (29/08/2018)

Certa feita, ao cabo de um dos seus célebres sermões, o padre Antônio Vieira foi interpelado por um dos seus ouvintes, que verdadeiramente maravilhado lhe perguntou: “Padre, por que o senhor fala tão bem? Por que o senhor demonstra tanto conhecimento e um poder tão grande de persuasão?” O santo padre sem tergiversar respondeu: “Meu filho, para se falar bem, para se falar bonito, não é necessário ter conhecimentos, competência ou possuir o dom da palavra. Basta, meu filho, que se fale com o coração”.
Convocado pelo presidente Vicente Maia para saudar os recipiendários, em nome do colégio acadêmico, longe de querer imitar o Padre Antônio Vieira; longe, bem longe de pretender ombrear-me ao maior orador sacro da humanidade, o faço, com as pobres palavras que irão brotando do âmago do meu coração.
A humanidade não celebra apenas os feitos heroicos, a paz após a guerra, as grandes realizações administrativas ou as festas cívicas. Celebra também, as virtudes dos santos e o valor do intelecto humano, especialmente através do ato da sagração acadêmica.
Nesta seção solene e simples como a vida dos santos, convocada para a sagração acadêmica dos confrades: César Oliveira Lima Barrio, formado em direito e doutor em história, exercendo a carreira de diplomata no Ministério das Relações Exteriores, em Brasília; Carlos Eduardo de Carvalho Vargas, residente em Curitiba, e autor do livro “A Misericórdia na Espiritualidade de Santa Elisabeth da Trindade”; Paulo de Barros Carvalho, professor emérito e titular da PUC/SP e da USP. É um estudioso do hagiológio. Moisés Rocha Farias, residente em Quixadá, é professor universitário; Zeni Luigia Cracco, residente no Estado de São Paulo, tem trabalhos sobre vários santos; Padre Antônio Murilo de Paiva, do Rio Grande do Norte, é formado em estudos sociais e filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte e Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Nahor Lopes Souza Júnior, de Itajaí, foi seminarista e tem trabalhos escritos sobre santos; Pedro Bezerra de Araújo, residente em Fortaleza, é médico, licenciado em Filosofia pura e bacharel em Teologia. Lamento não poder aqui adentrar aos currículos dos novéis acadêmicos. Currículos vastos e laureados por invejável formação acadêmica e intelectual. Todos estão aptos a integrar qualquer sodalício do mundo, pelos seus vastos conhecimentos e espíritos humanitários.
A honra de interpretar o júbilo do silogeu neste momento da sagração acadêmica de tão notáveis recipiendários, decorre das virtudes extraordinárias dos novéis acadêmicos, que certamente irão contribuir e engrandecer à Academia Brasileira de Hagiologia. Méritos e aptidões não faltam aos novos acadêmicos que ora ocupam as suas cadeiras e incorporam-se a nós, para juntos lutarmos pela grandeza desta arcádia.
Os recipiendários são proeminentes figuras que acreditam no papel temático desta arcádia, estando todos imbuídos do propósito que nos impulsiona e da força redentora das nossa ações.
A nossa academia, como quase todos os sodalícios brasileiros segue o modelo francês de quarenta cadeiras. A academia francesa de letras foi fundada pelo cardeal Richelieu, primeiro ministro e homem forte no reinado de Luís XIII, em 22 de fevereiro de 1635, tendo por finalidade a regulamentação da gramática, ortografia e literatura francesas.
A nossa arcádia destina-se ao estudo e pesquisa da vida dos santos, matéria ampla, profunda e palpitante, com uma imensa gama de conhecimentos. Pertencer a esta academia ao lado de figuras tão dignas e cultas, é sempre motivo de muita satisfação.
No sermão da Sexagésima, o padre Antônio Vieira afirmou: “Para se ver a si mesmo são necessárias três coisas: olhos, espelho e luz. Se tem espelho e é cego, não se pode ver por falta de olhos; se tem espelho e olhos, e é noite, não se pode ver por falta de luz; se tem luz e olhos, mas não tem espelho, não se pode ver por falta desse projetor. Logo são necessários olhos, espelho e luz”.
Aqui os acadêmicos terão tudo! A academia concorre com o espelho, que são os conhecimentos; Deus concorre com a luz, que é a graça; os acadêmicos concorrem com os olhos, que são os faróis dos seus conhecimentos.
Ilustres novéis acadêmicos
Neste dia histórico das suas entronizações na Academia Brasileira de Hagiologia, além da solenidade de posse, o desejo da diretoria e do colégio acadêmico é prestar-lhes uma homenagem. Não é fácil, no entanto, pinçar no vernáculo pátrio as palavras apropriadas para esse preito de louvor a tão dignos confrades. A única saída que encontro é tomar emprestadas as palavras de Marco Antônio, proferidas há mais de dois mil anos, na vetusta cidade de Roma. Para homenageá-los, só se a natureza, com os seus encantos; a natureza, com a sua sinfonia; a natureza com os seus mistérios; a natureza com os seus sons maviosos; a natureza, com as suas multicores, brincando de arco-íris, se curvasse inteira para cá e bradasse ao universo, aqui estão os melhores acadêmicos!
Disse-o!
Fortaleza, 29 de agosto de 2018.

Neuzemar Gomes de Moraes

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Discurso proferido na instalação da Academia Brasileira de Hagiologia, pelo seu Presidente José Luís Lira (11/02/2005)


São Paulo encerra sua segunda epístola aos Coríntios assim dizendo: “Todos os santos vos saúdam” e eu faço uso destas palavras para cumprimentar-vos festivamente nesta noite.
A História do Ceará prova que somos pioneiros. Aqui, primeiramente se deu liberdade aos seres humanos cativos e se criou a primeira Academia de Letras do País, a Academia Cearense de Letras, três anos antes da criação da Academia Brasileira de Letras. Por sinal, os votos de sucesso por parte do Presidente da ABL, acadêmico Ivan Junqueira, e a participação do imortal Antônio Olinto, conferem o reconhecimento daquela augusta Corte Literária à nova Entidade, enquanto o telegrama do Presidente Luís Inácio Lula, dá a dimensão da grandiosidade da instituição. Reiterando essa sina de pioneirismo e amor à cultura, nesta data instalamos a Academia Brasileira de Hagiologia, a primeira no mundo dedicada ao estudo dos santos, muito embora os avançados estudos da Bélgica em hagiologia, como bem lembrou o Mons. Sadoc de Araújo, com o termo Academia, a ABRHAGI é a primeira.
Num mundo que foi abalado pelo pecado de Adão e Eva, os santos viveram com os demais seres humanos, contudo, separados para Deus. Característica particular de Deus, os santos representam a perfeição em meio à imperfeição de que nos revestimos.
Mas, quem foram os santos? Biblicamente santo é aquele que faz a vontade de Deus, observa seus mandamentos e entre esses homens, encontramos camponeses, índios, nobres, plebeus, doutores, sábios e ignorantes, homens pobres ou abastados, religiosas e religiosos, sacerdotes, bispos, papas que largaram tudo para se dedicarem à causa de Deus, deixando, nas palavras do nosso Presidente de Honra, Dom José Bezerra Coutinho, “um rastro luminoso” de suas pegadas pela terra. Outros tantos se santificaram sem ainda ter seu reconhecimento.
Muitos têm-nos perguntado de quem foi a inspiração de se criar a ABRHAGI e vou então confessar-lhes um segredo: foi São Francisco, o poverello de Assis. Quando voltava de sua festa em Canindé, no mês de outubro, trazia na bagagem uma revista sobre a peça Francisco – o homem que se tornou santo. Ao presenteá-la à amiga Matusahila Santiago esta me sugeriu que criássemos uma Academia voltada para o estudo dos santos.
Assim, São Francisco nos inspirou. Pouco depois, passei a um estudo para saber sobre a existência ou não de academia no sentido de hagiologia ou hagiografia. Constatei através de informações e consultas a páginas na internet, muito especialmente nas do Vaticano e da CNBB, que não existia a mencionada academia, apesar de existirem algumas de caráter específico como a Academia Cristã de Letras, sediada em São Paulo, a Academia Marial de Aparecida, sediada em Aparecida, São Paulo e a Academia de Letras e Artes Mater Salvatoris, em Salvador e, ainda o Ciclo de Hagiografia, na Itália, o que nos permitiu afirmar que a Academia Brasileira de Hagiologia é a primeira do mundo. Feitas as constatações, buscamos dar-lhe vida e convidamos a desembargadora Gizela Nunes da Costa, para juntos formularmos a Academia Brasileira de Hagiologia.
Este ato de criar Entidade voltada para o estudo dos santos e candidatos à santidade reforça a tese do Prefeito da Comissão para as Causas dos Santos, cardeal José Saraiva Martin: “Os Santos ‘saíram da sacristia’ para serem estudados e apresentados também como personagens, histórica e culturalmente significativas, na vida da Igreja e da sociedade do seu tempo (...) Assim, a missão desses extraordinários homens de Deus continua, de maneira diferente, mas em todo o caso eficaz, a servir o bem da sociedade inteira”.
Alegrou-nos sobremodo a anuência de estudiosos do Ceará, do Brasil e do exterior que aceitaram integrar a ABRHAGI e aqui temos a expressiva representação do Ceará, e o pronunciamento do Mons. Francisco Sadoc de Araújo, postulador da Causa de Beatificação do Pe. Ibiapina e os demais acadêmicos por meio do discurso do Pe. Ismar Dias Matos, de Minas Gerais, postulador da Causa de Beatificação do Cônego Lafayette, e as correspondências das professoras Maria Helena Carvalho dos Santos e Regina Coeli Fonseca Raick, nossas correspondentes em Portugal.
Criada em 8 de dezembro de 2004, data do sesquicentenário da proclamação do dogma de fé da Imaculada Conceição de Maria Santíssima, no ano do sesquicentenário de criação da Arquidiocese de Fortaleza e 140 anos do Seminário da Prainha, nossa Academia é instalada no dia em que a própria Mãe de Deus e da humanidade disse a Bernadete, em Lourdes, “Eu sou a Imaculada Conceição”.
Maria – a Rainha do Céu – é, por excelência, exemplo e sinal de santidade. No livro da Sabedoria 1, 4, lemos que Deus jamais entrará numa alma de má-fé e jamais habitará num corpo sujeito ao pecado. Portanto, citando as palavras sábias do saudoso Mons. Antonino Cordeiro Soares, “Deus não teria encarnado em Maria se ela não fosse a própria pureza”.
A Imaculada Conceição Aparecida, padroeira do Brasil, é também a padroeira da Academia Brasileira de Hagiologia, criada no dia do centenário de sua coroação como Rainha do Brasil. Aos seus pés sacrossantos depositamos a ABRHAGI.
Enquanto fundador reitero os agradecimentos a todos os que nos honraram aceitando o convite a esse desafio que abraçamos: levar a todos o conhecimento sobre essas figuras fascinantes que modificaram nossas vidas e a História, os santos. Agradeço muito especialmente aos eminentes representantes do Clero e da sociedade brasileira que saúdo na figura do decano do episcopado brasileiro, Dom José Bezerra Coutinho, conselheiro e Presidente de Honra vitalício. Por outro lado, agradeço a confiança em mim depositada para ser o primeiro Presidente da ABRHAGI.
Agradeço mais uma vez às acadêmicas Matusahila Santiago e Gizela Nunes da Costa, pelo apoio e incentivo e, ainda, aos acadêmicos Norma e Teodoro Soares, pela publicação do livro “Breve Histórico da ABRHAGI”; ao sócio-honorário Newton Freitas, pelo coquetel que será servido; ao Colégio da Imaculada Conceição, pela solicitude de sua direção e de nossa querida Ir. Elisabeth Silveira, em permitir que aqui fosse sediada a Academia; à acadêmica Norma Zélia que tão bem conduz o cerimonial desta solenidade e, também, aos demais acadêmicos pelo apoio dado a este sonho que se concretiza.
A Academia está instalada, todos os seus componentes empossados e que os santos tão próximos de Deus, e d’Ele são sinais perfeitos, nos inspirem nessa caminhada.


José Luís Araújo Lira
Fortaleza, 11 de fevereiro de 2005


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Discurso proferido na Fundação da Academia Brasileira de Hagiologia por Mons. Francisco Sadoc de Araújo, representando os acadêmicos cearenses (08/12/2004)


A inopinada criação no Ceará da Academia Brasileira de Hagiologia, que hoje se inaugura como uma das primeiras do mundo chega-nos em boa hora, embora de surpresa. A corajosa iniciativa dos três acadêmicos fundadores José Luís Araújo Lira, Matusahila de Sousa Santiago e Gizela Nunes da Costa começa talvez até mesmo com certo retardamento, porque de fato os santos sempre merecem ser estudados e conhecidos, porque constituem a mais notável galeria de vultos notáveis que honram a humanidade e integram o mais rico patrimônio cultural da história da civilização. Embora com prevalência neles, não me refiro aqui apenas aos santos católicos, mas a todos os grandes líderes religiosos que se fizeram exemplares para admiração do mundo.
Mediante o estudo da hagiologia, nossa limitada inteligência tenta alcançar as zinas da perfeição humana, até ao mais alto grau aonde possa subir o poder do desenvolvimento ontológico da pessoa. Para obter tal objetivo, faz-se necessária profunda pesquisa que siga em duas direções: uma horizontal, rumo à compreensão da plenitude aberta ao homem para ser ele mesmo, e outra vertical, para chegar ao pleno conhecimento da natureza participativa daquele atributo essencial de Deus, que é a santidade entendida como revelação de sua glória.
Tudo isto está expresso na seguinte sentença de Jesus: “Sede perfeitos, como vosso Pai celestial é perfeito”. (Mt 5, 48). Como seres humanos, somos todos filhos “Santo”, somos imagens e semelhança de Deus, herdeiros da santidade que, quando participado, assemelha-nos fielmente ao pai.
Dentre os chamados atributos que, por via da analogia e da iminência, nos levam ao conhecimento da essência divina, destaca-se a santidade, por ser propriedade única e exclusiva de Deus, principalmente quando se refere ao Espírito Santo, terceira pessoa da Santíssima Trindade.
A idéia de que a santidade é o atributo identificador da essência divina já foi defendida e explicada pelo gênio oratório do padre Antonio Vieira no célebre sermão, pronunciado em Lisboa, no mosteiro de Odivelas, no dia de Todos-os-Santos do ano de 1644, quando assim proclamou: “é perfeição em Deus por ser eterno, porque eternamente santo; por isso é perfeição o ser imenso, porque é imensamente santo; por isso é perfeição por ser infinito, porque é infinitamente santo; por isso é perfeição o ser onipotente, porque é todo-podoresamente Santo”.
O significado desse atributo é expresso na língua hebraica pela raiz kdsh, que é polissênico e tem forma substantiva (qôdes) e forma adjetiva (qadosh) com sentido básico de separado ou distinto do comum. No uso popular, porém, a palavra incorporou a referência a tudo o que é divino, sagrado, numinoso. Para exprimir estas mesmas idéias, o grego bíblico assumiu o emprego do adjetivo “hágios”.
Já no Primeiro Testamento, o profeta Isaías descreve uma teofania celeste, em que se ouvem exclamações de louvor a Deus, que é assim aclamado: “Santo, santo, santo é Javé dos exércitos, a sua glória enche toda a terra” (Is 6,3). No Apocalipse, final do Novo Testamento, o apóstolo João descreve a mesma teofania, em que se escutam as mesmas palavras: “Santo, santo, santo, Senhor Deus todo-poderoso”. (Ap 4,8).
A tríplice repetição da palavra “santo” significa o superlativo absoluto. Portanto, três vezes santo significa santíssimo. Ao se referir a Deus, tal superlativo é elevado ao infinito. Só Deus é santo, por que Ele é a única origem e fonte inesgotável de todo ato ou qualquer estado de santificação. Como o bem é difusor de si mesmo, Deus nunca cessa irradiar abundantemente sua santidade por todo o universo.
A consciência desta presença universal da santidade divina levou os escritores da Bíblia a qualificar, com o adjetivo “santo”, inúmeros lugares e instituições: a terra, nação, a cidade, o acampamento, o monte, o caminho, o dia, a igreja, o sacerdócio, a lei, o tabernáculo, o jejum, o dízimo e tanta coisa mais. Também o povo e muitos grupos de pessoas, sejam anjos ou seres humanos, a Bíblia os chama de santos. Com relação a este assunto tão fascinante, são tantos os textos a citar que, infelizmente, não cabe, dentro deste pequeno espaço.
Tudo o que é santo neste mundo, o é por participação da única santidade de Deus. A santidade dos santos é, portanto, a mesma santidade de Deus por eles participada. Já nos recuados tempos do Levítico, o próprio Deus mandou a Moisés e Aarão que transmitissem tal doutrina aos israelitas: “Eu sou Javé, o Deus de vocês. E vocês foram santificados e se tornaram santos, porque eu sou santo”. (Lv 11,44)
Toda a história da Bíblia nada mais é do que a descrição da atuação da infinita santidade de nosso Deus, que continua agindo no mundo como o único salvador da humanidade.
A Igreja Católica, desde os tempos apostólicos, percebeu a verdade da participação da santidade divina nos seus mártires e confessores da fé, e por isso os declara santos e lhes presta respeitosa veneração e gratidão.
Os santos canonizados são verdadeiramente o mais precioso tesouro da Igreja e sua maior riqueza espiritual. Eles não concorrem com Deus na posse da santidade, mas apenas a revelam pelo testemunho de suas vidas exemplares.
Porque percebe a santidade divina a envolver tudo o que há de bom no mundo criado, a Igreja chama a Eucaristia de Santíssimo, o Papa de Santo Padre, o Vaticano de Santa Sé, o tempo da Páscoa de Semana Santa, o terço mariano de Santo Rosário, a adoração ao Santíssimo de Hora Santa, um feriado religioso de Dia Santo, o Novo Testamento de Santos Evangelhos.
Como a lei de orar é a mesma lei de crer, cabe aqui ressaltar um pequeno trecho litúrgico da Oração Eucarística III: “Na verdade vós sois santo, ó Deus do Universo (...), porque dais vida e santidade a todas as coisas”.
A auréola da santidade sempre encantou as grandes inteligências curiosas da verdade e sempre empolgou os grandes corações amantes da beleza.
O filósofo Bérgson passou anos a fio tentando decifrar a essência da mística cristã, que sempre o encheu de admiração. O psicólogo Gustavo Jung descobre o “inconsciente coletivo” envolvido na luminosidade do “numinoso”, única manifestação natural do consciente divino. O romancista Leon Bloy só encontra uma causa para explicar nossa infelicidade: a de não sermos santos. O antropólogo Teilhard de Chardin descreve o “meio divino” como o único ambiente propício para que o homem possa encontrar sentido em sua existência terrena. O genial poeta Dante Alighieri conclui sua belíssima Divina Comédia com um verso imortal exaltando o infinito Amor Criador, “Che muove il sol e l’altre stelle”.
O teólogo protestante Paul Tillich ensina que “somente o que é santo pode interessar ao homem de maneira absoluta, e só o que interessa ao homem de maneira absoluta possui o sinal da santidade”.
O teólogo católico Hans Urs Von Balthasar afirma que os santos são a mais importante interpretação do Evangelho, porque são interpretações encarnadas da Palavra de Deus encarnada, “que se fez carne para habitar entre nós”.
Conhecer a vida dos santos é garimpar preciosidades morais e espirituais, que brotam dos aluviões auríferos, escondidos nos rios mais profundos da alma humana purificados pela graça divina.
O poeta monge Dom Marcos Barbosa, na perspicácia de sua meditação beneditina, descobre tesouros de santidade no sim de Maria, nas lágrimas de Pedro, nas viagens de Paulo, no sangue de Estevão, na ternura de Inês, na Regra de Bento, na lição de Tomás.
No meado do século passado, tornou-se best-seller o livro de Fülop Miller intitulado “Os santos que abalaram o mundo”, onde ressalta a renúncia de Antão, a inteligência de Agostinho, o amor de Francisco de Assis, a força de vontade de Inácio de Loiola e o êxtase místico de Teresa d’Ávila.
O Estatuto desta Academia Brasileira de Hagiologia, art. 1º, identifica-a como uma sociedade civil, de caráter cultural e científico, o que exclui quaisquer laivos de fanatismo ou beatice em suas atividades e exige dos sócios o uso do método científico nas pesquisas, o emprego do diálogo interdisciplinar no estudo e a prática da heurística nas atividades culturais específicas, evidentemente sempre dentro do âmbito da finalidade principal de congregar pessoas interessadas em aprofundar o conhecimento do santo e do sagrado, dos movimentos messiânicos e da religiosidade popular.
Apenas principiantes no Brasil, é na Bélgica onde os estudos de hagiologia estão mais desenvolvidos e organizados, graças à iniciativa pioneira dos chamados bolandistas, equipe de padres jesuítas que, desde o início do século XVII, dedicam-se ao estudo e à publicação das “Acta Sanctorum”, coleção valiosa de obras resultantes das pesquisas realizadas em vasta documentação primária. Hoje em dia, a “Societé de Bollandistes” de Bruxelas trabalha em estreita parceria com o “Atelier Belge d’Études sur la Sainteté” da Universidade de Namur, que publica um boletim anual intitulado “Litterae Hagiologicae”.
Na Itália, funciona junto à Universidade de Roma a “Associazione Italiana per lo Studio dei Santi, dei Culti e dell’Agiografia” (AISSCA), que promove cursos acadêmicos e freqüentes seminários.
Nossa “Academia Brasileira de Hagiologia” começa hoje sob os melhores auspícios e, na certeza da intercessão de todos os santos e santas, promete um futuro de muitas realizações e de proveitosos serviços que, sem dúvida, serão prestados à cultura nacional.

Pe. Francisco Sadoc de Araújo
(Acadêmico e postulador da Causa do Pe. Ibiapina)

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